Publicado em: qui, 05/08/2021 - 11:56
Nesta semana o Presidente da República Jair Bolsonaro se envolveu em mais uma polêmica por conta dos seus pronunciamentos em entrevistas. Durante evento de assinatura do “Acordo de Cooperação Técnica Água nas Escolas”, no Ministério da Cidadania, Bolsonaro se mostrou contra a aplicação de impostos sobre as grandes fortunas ao questionar “é crime ser rico no Brasil”? Sua fala desagradou muita gente.
Na realidade, este imposto já está previsto na Constituição Federal, sendo um dos impostos da União, no art. 153, VII:
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
I - importação de produtos estrangeiros;
II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;
III - renda e proventos de qualquer natureza;
IV - produtos industrializados;
V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;
VI - propriedade territorial rural;
VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.
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Porém, esta lei complementar não existe, o que implica dizer que o Imposto Sobre Grandes Fortunas ainda não foi regulamentado e, por isso, não pode ser aplicado. Ele é um imposto federal, sendo assim, é de competência exclusiva da União para sua instituição e aplicação.
Na tal entrevista, o Chefe do Executivo deu a entender que não irá instituir e nem aplicar esse imposto. De forma irônica ele questionou se o fato de ser rico no Brasil era crime, demonstrando que esse imposto seria uma “punição” imerecida aos ricos.
“Alguém conhece algum empresário socialista? Algum empreendedor comunista? Alguns querem que eu taxe grandes fortunas no Brasil. É um crime agora ser rico no Brasil? A França há poucas décadas fez isso, e o capital foi para a Rússia”, disse o presidente.
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Talvez o presidente não saiba, mas esse Imposto Sobre Grandes Fortunas serviria para dar progressividade ao sistema tributário brasileiro. Ao realizar estudos e elaborar documentos a fim de reduzir as desigualdades tributárias, a Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco) concluiu que o Brasil seria capaz de arrecadar R$ 292 bilhões por ano se focasse algumas tributações nos “super-ricos” e não nos pobres.
Ao realizar essas mudanças, o sistema tributário iria avançar para a progressividade, sem afetar os mais pobres, através de uma tributação mais justa e social. Além disso, o acréscimo de recursos indicados no documento “Tributar os Super-ricos para Reconstruir o País” pode ser direcionado para incrementar políticas públicas de distribuição de renda, como o Bolsa Família.
Muita gente não sabe, mas o nosso sistema tributário é desigual e injusto e a prova disso é que os pobres pagam mais impostos que os ricos. Sim, parece loucura, mas é a realidade do Brasil. Isso acontece porque a carga tributária está concentrada nos impostos indiretos, ou seja, nas taxas sobre o consumo inseridas nos preços de toda e qualquer mercadoria.
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Ao invés de progredir, esse modelo de tributação nos aproxima da regressividade: de modo geral, os pobres pagam, proporcionalmente à sua renda e ao seu patrimônio, muito mais impostos do que os ricos. No nosso país, quanto menor o salário, proporcionalmente, maior é a carga tributária. Mas como isso pode ser possível?
Bom, na verdade, todos os indivíduos, apesar de terem rendas diferentes, pagam a mesma taxa embutida nos produtos consumidos, porém, o peso no bolso de cada um deles é muito diferente. De forma mais simplificada, um acaba perdendo mais do que outro. Vejamos um exemplo:
Imagine que um empresário ganhe R$ 11.000,00 por mês e uma trabalhadora doméstica que ganhe R$ 1.100,00. Ambos compram uma cesta básica no valor de R$ 300,00 em que R$110,00 desse valor corresponde a impostos indiretos. Neste caso, 10% da renda total da trabalhadora doméstica seria revertida em imposto sobre consumo desse produto. Em contrapartida, o empresário comprometeria apenas 1% do total de seu salário.
Com isso, pode-se afirmar que, apesar de pagarem o mesmo valor na compra desses produtos, a trabalhadora doméstica, proporcionalmente, acabou pagando 10 vezes mais impostos que o empresário rico. Ao tirar mais dos pobres do que dos ricos, o nosso sistema tributário acaba aprofundando a desigualdade que existe no nosso país.
Ainda sobre a infeliz e irônica fala de Bolsonaro, a Fenafisco publicou uma nota como resposta:
Ser rico no Brasil não é crime, mas é criminosa a desumanidade imposta pela elevada tributação sobre os mais pobres – que favorece a concentração de riqueza a um pequeno grupo às custas da miséria de milhares de brasileiros.
Mediante o exposto, o mais interessante seria que o governo federal tivesse a coragem e a honestidade de implementar esse Imposto Sobre Grandes Fortunas, colocando os super-ricos no sistema tributário e os pobres no orçamento público. Essa seria uma medida mais efetiva de ajustar, pelo menos em parte, o sistema tributário brasileiro, efetivando a justiça social e atenuar a desigualdade social.
Williane Marques de Sousa
Estudante de Direito – Estagiária Unieducar
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REFERÊNCIAS:
https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/bolsonaro-sobre-taxar-...
https://www.brasildefato.com.br/2019/01/28/entenda-porque-os-pobres-paga...
https://fenafisco.org.br/04/08/2021/nota-de-posicionamento-ser-rico-no-b...