Estado x Igreja: Investimentos Públicos em obras religiosas

Williane Marques de Sousa
Publicado em: sex, 30/07/2021 - 11:55

ESTADO LAICO
Todos sabem que o Estado brasileiro é um Estado laico. Isso significa dizer que no Brasil não existe uma religião oficial, muito menos uma religião obrigatória. Todos os brasileiros são livres para escolherem a religião que desejam seguir, contanto que não fira o direito do próximo, e o Estado não pode interferir nisso, devendo tratar todos de forma igualitária. Mas você sabia que nem sempre foi assim?!

Com a colonização portuguesa, o Brasil conheceu a religião católica. Até mesmo os índios foram catequizados, como forma de impor a religião aos nativos. Depois disso, o catolicismo passou a ser a religião oficial no Brasil e permaneceu assim até a Constituição Republicana, promulgada em 1891, que instituiu o Estado Laico e separou a Igreja do Estado. Como fruto desse longo período, atualmente a maior parte da população brasileira ainda segue a religião católica.

Mas não é pelo fato de terem sido separados que agora eles se tornaram inimigos. Em muitas situações a Igreja atua juntamente com o Estado, principalmente com o intuito de ajudar os mais necessitados e buscar diminuir o impacto da desigualdade social. A arrecadação e distribuição de alimentos e roupas para os que precisam e a realização de shows beneficentes são exemplos de ações que unem, para um bem maior, a Igreja e o Estado.

Porém, há quem negue veementemente a atuação conjunta entre essas duas instituições, principalmente no que diz respeito a investimentos públicos em obras religiosas. Elas imaginam que, pelo fato do Estado ser laico, ele não poderia colocar o dinheiro público em alguma obra ou construção da igreja católica, por exemplo. Mas o assunto divide opiniões.

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TURISMO RELIGIOSO E O MOVIMENTO DA ECONOMIA
Não se pode negar que as obras religiosas da igreja católica atraem muitas pessoas de outras regiões e até de outros países para o Brasil. E isso, consequentemente, melhora o setor turístico e a economia brasileira. Conforme o Ministério do Turismo, no ano de 2017, o Turismo Religioso movimentou R$ 15 bilhões no país e atraiu cerca de 30 peregrinos estrangeiros.

No Ceará, por exemplo, além da famosa estátua de Padre Cícero, localizada em Juazeiro do Norte, que atrai mais de 2,5 milhões de visitantes por ano, a cidade de Campos Sales, inaugurou no final do ano passado a estátua da Nossa Senhora da Penha, padroeira do município. O monumento foi construído com a intenção de reaquecer o setor devido as baixas causadas pela covid-19 e promete ser um atrativo para gerar renda para os moradores.

E A LAICIDADE DO ESTADO?
Em contrapartida ao pensamento favorável aos investimentos públicos em obras religiosas, em 2019, uma decisão do Poder Judiciário barrou a construção de uma estátua gigante de Nossa Senhora e determinou a remoção de cinco monumentos na cidade de Aparecida (SP), dedicados à Padroeira. A ação foi motivada por pedido da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea). A instituição alega que foi utilizada verba pública para a promoção da fé católica, o que, segundo eles, fere o estado laico.

A juíza do caso informou que não se pode permitir a subvenção de uma religião específica pelo Poder Público, tampouco que as verbas públicas sejam utilizadas para construção de obras religiosas quando existentes outras destinações de suma importância, em evidente a má utilização dos recursos públicos.

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DECISÃO DO STJ - 2015
“O governante que constrói igreja com dinheiro público não fere laicidade do Estado”. Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reformou a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que condenou o ex-prefeito César Maia por improbidade administrativa pelo fato de ter destinado R$ 150 mil do orçamento municipal à construção de uma igreja no bairro de Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Para o Tribunal de Justiça, esse investimento feriu o caráter laico do estado brasileiro (sem religião oficial) por ter beneficiado uma religião em detrimento de outras. Porém, o então ministro do STJ, Napoleão Nunes Maia Filho, entendeu que a laicidade do Estado não pode ser confundida com antirreligiosidade.

O ministro destacou a religiosidade do povo brasileiro, citou diversas iniciativas públicas em favor de outras denominações religiosas e que não houve enriquecimento ilícito ou prejuízo aos cofres públicos com o financiamento da construção da igreja. O entendimento, portanto, disse que a laicidade não impede o Estado de promover ações em favor da religiosidade de uma comunidade, mas sim a atitude de impor o seguimento de determinada crença.

Portanto, conclui-se que o investimento público em obras religiosas, em regra, não viola a laicidade do estado, devendo ser realizado sem violar nenhuma limitação legal. Além disso, é inegável que as atrações, estátuas e igrejas católicas são peças fundamentais no turismo religioso, o que impulsiona a economia do país e movimenta o mercado regional.

Williane Marques de Sousa
Estudante de Direito - Estagiária Unieducar

REFERÊNCIAS:
https://brasilturis.com.br/turismo-religioso-e-alvo-de-investimento-para...
https://www.sigamais.com/noticias/cidades/justica-barra-instalacao-de-es...
https://www.conjur.com.br/2015-dez-16/construir-igreja-dinheiro-publico-...

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