O “choro é livre”... Mas, quem enxuga essas lágrimas?

Williane Marques de Sousa
Publicado em: sab, 20/03/2021 - 14:28

Nos últimos dias, um dos assuntos mais comentados nas redes sociais foi a fala da repórter Maju Continho durante o Jornal Hoje, da TV Globo na última terça-feira (16). Ao falar sobre a aplicação do lockdown, medida restritiva para conter o coronavírus, Maju expressou sua opinião favorável a essa medida de uma maneira um tanto infeliz ao dizer que “o choro é livre, não dá pra gente reclamar”. Essa fala foi muito criticada por várias pessoas nas redes sociais. Mas, por que essa frase gerou tanto incômodo? 

Os estados brasileiros, desde março de 2020, vêm adotando medidas restritivas de deslocamento e eventualmente proibindo o funcionamento de atividades consideradas não essenciais, a fim de conter a proliferação do vírus. Com isso, muitos pais e mães de famílias acabaram perdendo seu emprego e ficando sem renda. Isso agravou a questão da desigualdade social na pandemia, fazendo com que essas pessoas se vissem em um estado de extrema dificuldade, sem meios de prover bens básicos às famílias. Muitas dessas pessoas, inclusive, estão fazendo manifestações nas ruas contra a determinação de lockdowns em seus estados.

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Sabemos também que existem pessoas que ganham seu sustento e o de sua família de forma autônoma e informal, vendendo produtos e serviços nas ruas ou em parques de camelôs, por exemplo. Com as medidas de isolamento e a determinação de toques de recolher, essas pessoas são impedidas de sair para trabalhar e conquistar o pão de cada dia. E foi justamente esse conjunto de trabalhadores que mais se sentiu ofendida com a fala da Maju durante a reportagem.

Infelizmente, essas medidas são necessárias para combater a proliferação do coronavírus e, assim, evitar um colapso no sistema de saúde. Mas isso não é desculpa para simplesmente “fechar tudo” e deixar um bom número de famílias desamparadas, sem nenhum meio de obter seu sustendo. O Estado, sendo aquele que tem o dever de garantir o bem-estar social, tem como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (Art. 3°, III, CF). Logo, o Estado deve adotar medidas que garantam o sustento daqueles que não podem sair de casa para trabalhar, pelo menos até que tenhamos vacinas para todos os brasileiros.

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Pensando nessas pessoas e na tentativa de amenizar os danos causados por estas restrições, o governo brasileiro propôs a solução do auxílio emergencial. Porém, os valores oferecidos estão longe de suprir todas as demandas das pessoas que perderam seus empregos. Mas a falta de dinheiro estatal com certeza não é uma desculpa para isso, visto que, apesar da crise que estamos vivendo, o Governo Federal disponibilizou R$ 1.2 trilhão em recursos para os bancos (1), dinheiro esse que nem sequer foi repassado – como empréstimo - para ajudar na sustentação das empresas menores (2).

Eis o motivo da expressão “o choro é livre”, dita pela repórter Maju em rede nacional, soar tão ofensiva aos ouvidos de muitos, pois existem sim, pessoas lamentando pela falta de recursos e pela impossibilidade de sair para trabalhar. Muitas dessas pessoas sequer conseguiram o auxílio emergencial, por falta de algum documento ou até mesmo pela falta de informação. As que conseguiram o auxílio, não estão conseguindo suprir todas as suas necessidades e nem as de sua família, pelo baixo valor fornecido.

A fala de Maju indignou não só as pessoas que sofrem sem emprego na pandemia: muitos internautas, telespectadores e até políticos usaram as redes sociais para criticar a forma como a apresentadora se posicionou. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, publicou em seu Twitter: “Do alto de sua arrogância global e de seu alto salário, Maju Coutinho defendeu lockdowns e debochou de quem precisa trabalhar para não passar fome. Segundo Maju, se você não pode ficar em casa, ‘O CHORO É LIVRE, É ISSO QUE TEM’(...)”, conforme publicou o site “Istoé” (3).

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Devido tal repercussão, Maju se pronunciou na quinta-feira (18) informando que sua fala foi apenas um improviso e também se desculpou. O site “Gente – iG” (4) publicou o pronunciamento da repórter, veja:

"Anteontem, para reforçar a necessidade do isolamento social, eu usei, no improviso, uma expressão infeliz que precisava de um complemento para deixar bem claro o que eu queria dizer. Eu disse: 'O choro é livre'. Com isso, eu quis dizer que por mais amargos que sejam as medidas de isolamento. Elas são necessárias para evitar o colapso do sistema de saúde".

Maju continuou seu esclarecimento:

"Mas eu também entendo perfeitamente a dor dos pequenos, médios e micro empresários que são obrigados a manter os negócios fechados. E vocês [telespectadores] são testemunhas. Ontem mesmo exibimos uma reportagem sobre o assunto e eu desejei agilidade por parte do governo e do congresso para atender as necessidades dos empresários e das famílias que aguardam o auxílio emergencial. Então eu reitero aqui o meu desejo, me desculpo pela expressão que usei anteontem e bola pra frente".

O fato é que estamos vivendo momentos muito difíceis para toda a população que requer, além de medidas de isolamento e de proteção, muita empatia e ajuda do próximo. Devemos continuar nos cuidando e evitando aglomerações. As pessoas que não têm a necessidade de sair devem ficar em casa, mas as que não têm essa condição, devem ser amparadas pelo Estado. Afinal de contas, o vírus mata, mas a fome também.

Williane Marques de Sousa
Estagiária Unieducar – Estudante de Direito

REFERÊNCIAS:

  1. https://www.infomoney.com.br/economia/com-crise-banco-central-ja-anuncio...
  2. https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2020/04/05/guedes-...
  3. https://istoe.com.br/maju-coutinho-gera-polemica-ao-falar-sobre-lockdown...
  4. https://gente.ig.com.br/tvenovela/2021-03-18/maju-pede-desculpa-por-come...

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