Cyberbullying no Metaverso – O Papel das Escolas, Famílias e Alunos

Juracy Braga Soares Junior
Publicado em: sab, 01/01/2022 - 12:03

A discussão em torno da prática de Bullying já avançou bastante com os estudos e pesquisas relacionadas ao ambiente virtual. O Cyberbullying, como ficou conhecido o conjunto de ações de agressão e assédio, não é um privilégio do ambiente escolar. Nosso foco, contudo, pelo menos nesse breve ensaio, é o Cyberbullying no ambiente escolar, e como se dará essa migração para o ambiente do Metaverso.

29% dos adolescentes afirmam terem sido vítimas de Bullying em São Paulo
A Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FM-USP realizou uma pesquisa que apontou que 29% dos alunos já foram vítimas de ações de bullying em 2019. Dos quase 3.000 pesquisados, 23% ainda relataram ter sofrido outro tipo de violência, enquanto 15% afirmaram ter praticado bullying com seus colegas; e 19% terem sido autores de outro tipo de violência. O levantamento foi realizado junto a alunos de escolas públicas e privadas em São Paulo, repercutida pela Agência Brasil.

ONU afirma que 33% dos alunos no mundo sofrem Bullying
O cenário no âmbito global parece ser o mesmo. Pelo menos é o que aponta a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – UNESCO, que até instituiu o dia 5 de novembro como o Dia Internacional contra a Violência e o Bullying na Escola. Segundo a UNESCO, um a cada três alunos sofre com o Bullying. Ainda de acordo com os dados da Organização, as crianças mais expostas ao risco de sofrerem bullying são as que podem ser consideradas "diferentes" pelos seus colegas.

Brasil é o 4º colocado no ranking mundial na prática de Cyberbullying
Levantamento da UNICEF evidencia que a realidade brasileira afeta 37% dos alunos, quando perguntados se já foram vítimas de práticas de Cyberbullying. No Cyberespaço, a rede social Facebook desponta como o principal campo de ocorrência da prática.

Estudantes brasileiros lideram faltas às aulas por Cyberbullying no mundo
Na mesma pesquisa, ao serem questionados sobre motivos de ausências ao ambiente escolar, 36% dos alunos brasileiros relataram situações em que a falta à escola se deu em função de terem sido alvos de ataques online por parte de colegas, após terem sofrido Cyberbullying de colegas de classe. Esse é o mais elevado percentual verificado pela pesquisa no mundo.

Lei define Bullying e Cyberbullying no Brasil
A Lei No. 13.185/2015 instituiu no Brasil o Programa de Combate à Intimidação Sistemática - Bullying. O parágrafo 1º do Art. 1º define:
 

§ 1º No contexto e para os fins desta Lei, considera-se intimidação sistemática (bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas.

Em seguida, o parágrafo 2º, lista as caraterísticas de que os atos podem se revestir:

Art. 2º Caracteriza-se a intimidação sistemática (bullying) quando há violência física ou psicológica em atos de intimidação, humilhação ou discriminação e, ainda:
I - ataques físicos;
II - insultos pessoais;
III - comentários sistemáticos e apelidos pejorativos;
IV - ameaças por quaisquer meios;
V - grafites depreciativos;
VI - expressões preconceituosas;
VII - isolamento social consciente e premeditado;
VIII - pilhérias.

Ainda no Art. 1º, em seu parágrafo único, a referida Lei aponta para o que é considerado Cyberbullying, detalhando:

Parágrafo único. Há intimidação sistemática na rede mundial de computadores (cyberbullying), quando se usarem os instrumentos que lhe são próprios para depreciar, incitar a violência, adulterar fotos e dados pessoais com o intuito de criar meios de constrangimento psicossocial.

As práticas de Bullying e Cyberbullying – infelizmente - não são exclusividade do ambiente escolar. Muitos adultos sofrem bastante com esse tipo de ataque. Contudo, na infância e adolescência é que fazem mais vítimas, naturalmente pela tenra idade e a natural dificuldade para lidar com esse tipo de violência.

Bullying, Cyberbullying e o risco de depressão e Suicídio
Artigo publicado no Journal of the American Academy of Child e Adolescent Psychiatry ainda em 2007 aponta para quadro preocupante sobre o tema. Segundo o estudo intitulado (em tradução livre para o português) Bullying, depressão e suicídio em adolescentes, a principal conclusão é: 

A vitimização e o bullying são fatores de risco potenciais para depressão e suicídio na adolescência. Nas avaliações de alunos envolvidos em comportamento de bullying, é importante avaliar a depressão e a tendência ao suicídio.

O mesmo estudo aborda ainda outras questões que são majoritariamente ignoradas pela grande mídia, quais sejam:

A exposição frequente à vitimização ou intimidação de outras pessoas foi relacionada a altos riscos de depressão, ideação e tentativas de suicídio em comparação com adolescentes não envolvidos em comportamento de intimidação.
O envolvimento infrequente em comportamento de bullying também foi relacionado ao aumento do risco de depressão e suicídio, particularmente entre meninas.
Os resultados indicam que tanto as vítimas quanto os agressores estão sob alto risco e que os adolescentes mais problemáticos são aqueles que são vítimas e agressores.
A psicopatologia foi associada ao comportamento de bullying dentro e fora da escola.

Outro dado preocupante que o estudo acima indicado aponta é que – dentre os adolescentes na faixa etária de 12 a 15 anos – vítimas de Bullying, o risco de suicídio é três vezes maior. Dentre os pesquisados, 17% relataram terem considerado atentar contra a própria vida como meio de fuga para a perseguição de colegas. E o percentual sobe para 80% quando a pergunta diz respeito à ansiedade. Fica evidenciado que não só afeta a saúde mental, como prejudica irremediavelmente o desempenho acadêmico.

Metaverso, a nova fronteira do Cyberbullying
Em outubro de 2021 o Facebook fez uma declaração ao mundo, sobre o quanto está decidido a investir na construção de um Metaverso que domine as mais diversas áreas da sociedade num futuro próximo. Para começar, mudou o nome da companhia para ‘Meta’. Em seguida, anunciou que investirá – a princípio – US$ 10bi em seu projeto Reality Labs – que é o setor da companhia encarregado da materialização do Metaverso da gigante da mídia social. Se quiser saber mais sobre o tema, acesse o artigo ‘Metaverso e o fim da Educação a Distância’, disponível aqui no Blog Unieducar. 

Essas informações já fornecem pistas sobre a relevância do projeto para o maior conglomerado de redes sociais tem como prioridade. E isso é algo para prestarmos bastante atenção. O fundador - Mark Zuckerberg - não vai aplicar bilhões de dólares em algo que já não tenha sido esquadrinhado para se transformar em um novo ambiente onde tudo (ou quase tudo) passará a acontecer. Desde aulas, passando por reuniões corporativas e – evidentemente – muito entretenimento online.

É muito cedo para projetarmos as mudanças – positivas ou não – que o Metaverso vai gerar em nossas vidas. Contudo, uma coisa é certa: a iniciativa vai incrementar exponencialmente a quantidade de horas que passamos conectados. E isso, por si só, vai impactar fortemente a saúde mental de crianças e adolescentes.

Se há tempos o Bullying já migrou para o mundo digital, passando até mesmo a assumir a denominação de Cyberbullying, com o Metaverso essas práticas violentas serão intensificadas. Por enquanto, uma afirmação do tipo: ‘casos de depressão e tentativas de suicídio aumentarão’ não passam de especulação. Contudo, profissionais da Psicologia já estão às voltas com um número cada vez maior de casos de Comportamentos Suicidas na Infância e na Adolescência, sendo que, uma boa parte é oriunda de distúrbios causados – direta ou indiretamente – pela presença ou acesso às redes sociais. 
 

Profissionais da Psicologia terão que montar consultórios no Metaverso
Muitos vão ler esse subtítulo e simplesmente achar que estamos alucinando. Outros vão simplesmente desdenhar e até embasarão sua atitude em normas regulatórias da profissão. Contudo, podemos apostar – sem medo de errar – que as normas regulatórias é que se adequam à realidade e não o contrário.

Para dar um exemplo, vejamos o caso da possibilidade de utilização massiva da TeleMedicina, que vinha sendo debatida desde o início dos anos 2000. Não era implementada por resistência ativa dos Médicos e seus Conselhos Federal e Regionais. Volte ao mês de março de 2020. A partir do momento em que a pandemia do COVID-19 foi oficialmente declarada no Brasil, o que aconteceu com todos aqueles argumentos contra a TeleMedicina?

Então, certamente essa não é uma aposta maluca. O número de atendimentos – junto a crianças, adolescentes e adultos – futuras vítimas não só de Cyberbullying, mas também de Nomofobia, termo científico que denomina a Síndrome da Dependência Digital – crescerá ainda mais. Essa síndrome é caracterizada pela ânsia e medo de ficar desconectado. Nos EUA a doença é denominada Internet Addiction Disorder – IAD e já movimenta estudos junto à comunidade científica desde meados da década de 1990.

O Metaverso na Escola ou a Escola no Metaverso?
Como dito acima, um dos três ambientes que serão – imediata e mais fortemente impactados pela disseminação do Metaverso – serão a Educação, reuniões corporativas e entretenimento. A Educação, contudo, tende a concentrar uma forte onda de consequências negativas, tendo em vista a atual escalada de doenças vinculadas ao excesso de tempo conectados e ao Cyberbullying. A Atuação da Psicologia durante e após a Pandemia já prenuncia que tempos difíceis virão, quando o assunto é Saúde Mental.

Crianças vão preferir ‘Jogar Escola’ no Metaverso, a interagir presencialmente
A partir do momento em que o Metaverso estiver com todos os seus ‘blocos de programação’ finalizados, conforme profetiza Zuckerberg, milhares de crianças certamente vão preferir ‘Jogar Escola’ do que vivenciá-la presencialmente. Tem dúvidas? Olhe para o que já acontece hoje com milhares de jovens que simplesmente param de interagir (presencialmente) com amigos e familiares, optando pela interação exclusivamente no universo online.

A frase ‘Jogar Escola’, dita acima, não é força de expressão. O Metaverso vai – definitivamente – transformar uma aula online (que hoje é chata) num ambiente lúdico, interativo e imprevisível. Quer ter um vislumbre disso? Assista a um trecho do vídeo divulgado pelo Facebook Connect 2021 sobre como será esse ambiente. Vá direto para o minuto 4:00 e ative as legendas em português, clicando no botão da engrenagem (configurações), localizado no canto inferior direito da tela.

Relatos de familiares que levam seus filhos a reuniões com parentes, e esses simplesmente permanecem 100% conectados, com olhos fixos em seus dispositivos móveis, interagindo com colegas por meio da interface do jogo, são cada vez mais comuns. E o que acontece quando se desconectam? Percebem que não possuem aqueles ‘poderes’ disponíveis no ambiente online. O Metaverso vai produzir uma geração de dependentes online.

Casos de Cyberbullying devem explodir no Metaverso. Esa nova tecnologia digital funcionará – também - como ferramenta impulsionadora ao Cyberbullying. Situações de agressão e assédio moral, organizadas por grupos de alunos nesse ambiente virtual vão gerar milhares de novas vítimas - no mundo real – a cada ano. Esses são alguns dos novos desafios também para professores e gestores escolares.

Para os Professores e Psicólogos que já atuam e desejam continuar atuando relevantemente num futuro próximo, é muito lógico imaginarmos que: Entender, estudar, pesquisar e – obviamente – participar do Metaverso será, portanto, condição de sustentabilidade profissional. Instalar-se profissionalmente no Metaverso será - muito provavelmente – uma condição básica para interagir com seus futuros alunos e pacientes. Quer saber mais sobre o Metaverso e sobre como se preparar profissionalmente para atuar nesse novo ambiente digital? Acesse o artigo ‘Seu Próximo Emprego pode ser no Metaverso’, disponível aqui no Blog Unieducar.

O Papel que cabe às Escolas, Famílias e Alunos é o de aprendizado permanente. Será preciso, portanto, experimentarmos cada vez mais a empatia. Importarmo-nos com o outro é um exercício diário a ser cumprido. Não há universo paralelo para onde escaparmos da realidade. Nossa tarefa é melhorarmos o nosso mundo real. As interações físicas, presenciais, devem ser sublimadas, ao ponto em que a experiência de estarmos na presença de nossos semelhantes seja recompensador.

Quer saber mais sobre o tema? Você pode participar de diversas maneiras: Fazendo parte de nosso Corpo Docente; enviando suas perguntas e sugestões de novos Cursos, Seminários, Palestras e Workshops; e propondo novas ações de Educação a Distância. Envie-me por e-mail sua opinião sobre o que podemos fazer para melhorar nossas ações na Educação a Distância, até mesmo antes que ela seja dizimada pelo Metaverso : )

Prof. Dr. Juracy Soares
É professor fundador da Unieducar. Fundador e Editor Chefe da Revista Científica Semana Acadêmica. Graduado em Direito e Contábeis. Especialista em Auditoria, Mestre em Controladoria e Doutor em Direito. Possui Certificação em Docência do Ensino Superior. É pesquisador em novas tecnologias para EaD/E-Learning. Escritor e autor do livro Enriqueça Dormindo. E-mail: juracy.soares@unieducar.org.br 

Nota do editor: os textos, fotos, vídeos, tabelas e outros materiais iconográficos publicados no espaço “opinião” não refletem necessariamente nosso pensamento, sendo de total responsabilidade do(s) autor(es) as informações, juízos de valor e conceitos divulgados.