Participação Política das Mulheres - Novas Regras

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Publicado em: seg, 11/07/2022 - 18:05

Em 2021, a Oxfam (Organização não governamental que tem como objetivo combater a pobreza, as desigualdades e as injustiças em todo o mundo) realizou uma pesquisa buscando analisar a relação entre as desigualdades e a democracia no Brasil.

O relatório resultante – denominado “Democracia Inacabada: um retrato das desigualdades brasileiras” – evidencia que a participação de mulheres no ambiente legislativo ainda é muito abaixo do desejável.

Conforme o documento, O Brasil é frequentemente mencionado como exemplo negativo de presença de mulheres no Parlamento. No cenário internacional, o Brasil ocupava a 133ª posição no ranking anual de mulheres nos parlamentos nacionais da Inter-Parliamentary Union (IPU), entre 192 países monitorados em 2019.

A legislação brasileira já aprovou diversas regras relativas à reserva de candidaturas de mulheres. No entanto, também houve a adoção de estratégias, por partes das agremiações partidárias para burlar a implementação das cotas – de modo que a representação continua deficitária.

Em 2018, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) publicou a Resolução TSE nº 23.575, segundo a qual as cotas também devem incidir também sobre os recursos financeiros e organizativos das eleições – o que implementou um ajuste de redistribuição não apenas da apresentação formal das candidaturas, mas dos recursos necessários para que uma candidatura seja competitiva.

Essa mudança tem sido considerada a principal responsável pelo crescimento de cinco pontos percentuais de mulheres eleitas, em 2018, para a Câmara dos Deputados.

Atualização Jurídica - Direito Eleitoral
 

A Emenda Constitucional (EC) nº 117, editada em 05/04/2022, positivou entendimentos já consolidados do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria, e trata acerca dos seguintes temas:

  • Manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres;
  • Cota de gênero e campanha eleitoral (financiamento e tempo de propaganda);
  • Situação dos partidos que não observaram a cota de gênero até a edição da emenda.

Primeiramente, em relação à manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, temos, por força da emenda, foi atribuído status constitucional à previsão legal já existente de que os Partidos devem destinar pelo menos 5% dos recursos do Fundo Partidário para participação das mulheres na política (ver art. 44, V, Lei nº 9.096/1995 e art. 22, da Resolução TSE nº 23.604/2019). Assim, a previsão de programas de incentivo à participação feminina não pode mais ser suprimida pelo legislador infraconstitucional.

A segunda mudança trazia pela emenda relaciona-se à cota de gênero (art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/97 e consiste na obrigação de o partido reservar, pelo menos, 30% de candidaturas para cada sexo) e as campanhas eleitorais, especificamente em relação ao seu financiamento e tempo de propaganda.

Atualização Jurídica - Direito Eleitoral – Desafios Pós Fake News
 

Nos termos da EC nº 117, o montante do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e da parcela do fundo partidário destinada a campanhas eleitorais, bem como o tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão a ser distribuído pelos partidos às respectivas candidatas, deverão ser de no mínimo 30% (trinta por cento), proporcional ao número de candidatas, e a distribuição deverá ser realizada conforme critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção e pelas normas estatutárias, considerados a autonomia e o interesse partidário.

A cota de gênero de 30% também deve ser observada em relação à distribuição do tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.

CAVALCANTE e BORGES (2022) destacam que a obrigação do partido estará cumprida com a destinação do percentual mínimo de recursos para candidaturas femininas, não se exigindo que esse percentual seja dividido igualitariamente entre as candidatas. O terceiro e último ponto da emenda trata da situação dos partidos que não observaram a cota de gênero até a edição da emenda, com o objetivo de regularizar a situação dos partidos.

Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

Não serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça (cota étnico-racial) em eleições ocorridas antes da promulgação da EC nº 117/2022.

Em outras palavras, os partidos inadimplentes até a data da edição da Emenda Constitucional (05/04/2022) poderão utilizar os recursos correspondentes nas eleições subsequentes, sem que a irregularidade possa ensejar penalidade na prestação contas.

A nova regra, no entanto, vale somente para prestações de contas que ainda não tenham sido definitivamente julgadas. Na opinião de CAVALCANTE e BORGES, pode-se afirmar que a EC nº 117/2022 anistiou os partidos que descumpriram o dever de destinar percentual mínimo de recursos para candidaturas femininas.

Atualização Jurídica – Eleitoral – Justiça Eleitoral
 

Bibliografia

Emenda Constitucional nº 117, de 5 de abril de 2022. Altera o art. 17 da Constituição Federal para impor aos partidos políticos a aplicação de recursos do fundo partidário na promoção e difusão da participação política das mulheres, bem como a aplicação de recursos desse fundo e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e a divisão do tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão no percentual mínimo de 30% (trinta por cento) para candidaturas femininas. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc117.htm.

CAVALCANTE, Márcio André Lopes e BORGES, Robério Moreira. Comentários à emenda constitucional 117/2022. Abril de 2022. Disponível em: https://www.dizerodireito.com.br/2022/04/comentarios-emenda-constitucion....
https://www.oxfam.org.br.

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