Publicado em: qua, 05/01/2022 - 14:11
O objetivo deste artigo é esclarecer – de forma bastante objetiva – as principais dúvidas sobre como o Contador pode atuar como Perito Contador, seja em âmbito Judicial ou Extrajudicial. Para tanto, vamos fornecer informações baseadas na legislação Civil e naquela que regula a profissão do Contador. Para que o texto funcione da maneira mais didática possível, vamos apresentar os temas em formato de lista de perguntas e respostas. Vamos lá!
QUAL É A LEGISLAÇÃO QUE REGE A PROFISSÃO CONTÁBIL NO BRASIL?
No período pós-império, a primeira norma legal a regular a profissão Contábil no Brasil foi o Decreto-Lei Nº 9.295/1946. Esse diploma – ainda em vigor - criou o Conselho Federal de Contabilidade – CFC e definiu as atribuições do Contador. Como naquela época havia ainda poucos cursos de nível superior, esse dispositivo ainda previa uma autorização temporária para os chamados ‘provisionados’, que era a denominação atribuída aos profissionais leigos (sem graduação superior em Ciências Contábeis) que já atuavam como ‘Guarda-Livros’, que era como se chamavam os antigos profissionais da Contabilidade. A partir daí, outras normas – especialmente editadas pelo CFC – passam a regular a profissão do Contador.
Perícia Administrativa e Judicial – Perguntas e Respostas
QUE PROFISSIONAL PODE ATUAR COMO PERITO CONTADOR?
O referido Decreto-Lei Nº 9.295/1946 estabelece em seu Art. 25, c, § 2º., que as atribuições a seguir listadas, são privativas dos Contadores diplomados:
Perícias Judiciais ou Extrajudiciais, revisão de Balanços e de contas em geral, verificação de haveres revisão permanente ou periódica de escritas, Regulações Judiciais ou Extrajudiciais de avarias grossas ou comuns, assistência aos Conselhos Fiscais das Sociedades Anônimas e quaisquer outras atribuições de natureza técnica conferidas por lei aos profissionais de contabilidade.
Observe que na transcrição do dispositivo legal acima, tanto a Perícia quanto a Auditoria Contábil (tratada ainda como ‘revisão’) são atribuições privativas do que o decreto-lei tratava por ‘Contadores diplomados’. Essa distinção foi importante na época, tendo em vista que ainda poderiam exercer algumas atribuições menos complexas, os chamados ‘Guarda-Livros’.
Já – mais recentemente - o item 4 da Norma Brasileira de Contabilidade, NBC TP Nº 1-r1/2020 também resguarda:
Perícia Contábil é de competência exclusiva de Contador em situação regular em Conselho Regional de Contabilidade.
Então, respondendo objetivamente à pergunta acima, somente os Contadores podem atuar como Perito Contador – desde que inscrito e em situação regular junto ao CRC - tanto em âmbito Judicial quanto Extrajudicial.
Prova Pericial Contábil em Processo-Judicial
O QUE É CONSIDERADO TRABALHO DE PERÍCIA CONTÁBIL?
A NBC TP Nº 1-r1/2020 define em seu item 2 a Perícia Contábil como sendo:
Perícia Contábil é o conjunto de procedimentos técnico-científicos destinados a levar à instância decisória elementos de prova necessários a subsidiar a justa solução do litígio ou constatação de fato, mediante Laudo Pericial Contábil e/ou Parecer Pericial Contábil, em conformidade com as normas jurídicas e profissionais e com a legislação específica no que for pertinente.
Observe que o conceito normativo da Perícia está atrelado à necessidade de decisão. Ou seja, o esforço realizado pelo Perito Contador deve ser orientado à solução das dúvidas e eventuais esclarecimentos necessários à tomada de decisão. Essa decisão – a ser tomada pela ‘instância decisória’ – se faz necessária para solucionar algum tipo de lide ou até mesmo para constatar fato. Em suma, a Perícia Contábil será necessária sempre que o conhecimento Contábil se mostrar necessário para orientar a resolução de uma demanda específica.
O TRABALHO DE PERÍCIA CONTÁBIL É CONSIDERADO PROVA NO JUDICIÁRIO?
Sim. Tanto no Judiciário como administrativamente, conforme se depreende da leitura do item 2 da NBC TP Nº 1-r1/2020, o trabalho do Perito Contador (Laudo o Parecer) é elevado à condição de Prova, a ser apreciada no âmbito do Poder Judiciário ou extrajudicialmente:
Perícia Contábil é o conjunto de procedimentos técnico-científicos destinados a levar à instância decisória elementos de prova necessários a subsidiar a justa solução do litígio ou constatação de fato...
Já o Código Civil (Lei No. 10.406/2002) define em seu Art. 212, V:
Art. 212. Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode ser provado mediante:
V - Perícia.
Atente para o fato de que deixamos claro que o resultado do trabalho do Perito Contador fica à disposição do Magistrado ou da entidade administrativa demandante para ser apreciado como prova. Ou seja, é um elemento que pode vir a ser considerado prova relevante para a solução da questão. Não significa – portanto – afirmarmos que o Juiz ou o contratante estão Vinculados ou Obrigados a considerar o Laudo ou Parecer como elementos probantes.
Um ponto importante a sublinhar aqui decorre dessa restrição do escopo. O item 3 da NBC TP Nº 1-r1/2020 determina:
O laudo pericial contábil e o parecer pericial contábil têm por limite o objeto da perícia deferida ou contratada.
Ou seja: O Perito Contador jamais poderá avançar (extrapolar) em seu exame, verificando ou se reportando a fatos, documentos ou práticas que não foram objeto de questionamento para orientar seu trabalho.
A Perícia Judicial como Meio de Prova em Processos Judiciais
QUAIS SÃO AS DUAS GRANDES CLASSIFICAÇÕES DA PERÍCIA CONTÁBIL?
A Perícia Contábil pode ser desenvolvida de acordo com o campo de atuação, nessas duas grandes áreas: no âmbito Administrativo e no Judiciário. Sobre esse aspecto o item 5.A da NBC TP Nº 1-r1/2020 esclarece:
Perícia Judicial é exercida sob a tutela do Poder Judiciário. A Perícia Extrajudicial é exercida no âmbito arbitral, estatal ou voluntária. A Perícia Arbitral é exercida sob o controle da Lei de Arbitragem e pelos regulamentos das Câmaras de Arbitragem. Perícias Oficial e Estatal são executadas sob o controle de órgãos de Estado. Perícia Voluntária é contratada, espontaneamente, pelo interessado ou de comum acordo entre as partes.
COMO SE DÁ A ATUAÇÃO DO PERITO CONTADOR EXTRAJUDICIAL?
O Contador pode ser contratado para atuar fora do Judiciário. Essa atuação se dá mediante contratação da parte interessada (empresa, órgão público ou instituição sem fins lucrativos) na realização de um trabalho de Perícia Contábil. Ao ser contratado para atuar como Perito Contador Extrajudicial, o Perito deverá orientar seus esforços na direção de responder as dúvidas apresentadas pela parte contratante em forma de quesitos. Ao concluir seu trabalho, o Perito Contador oferecerá o Parecer Pericial Contábil, nos termos do que aponta a NBC TP Nº 1-r1/2020.
COMO SE DÁ A ATUAÇÃO DO PERITO CONTADOR NO JUDICIÁRIO?
No âmbito do Poder Judiciário a atuação do Contador pode se dar de duas maneiras bem distintas: Como Perito do Juiz ou Perito Contador. E como Perito Assistente; Perito Contador Arbitral; Perito Contador Assistente ou ainda como Perito Contador da Parte.
O Art. 465 do Novo CPC 2015 (Lei Nº 13.105/2015), define:
O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo.
Depreende-se da leitura do artigo acima que, sempre que que a prova do fato depender da opinião acerca de fatos, atos, negócios ou avaliações que envolvam exame Contábil, a produção do Laudo Pericial ficará exclusivamente a cargo de um Perito Contador. Esse exame – realizado a partir da nomeação do Juiz – será considerado Laudo Pericial, tendo em vista que deverá ser um trabalho imparcial.
A partir da nomeação de um ‘Perito Judicial’, a legislação permite que cada parte contrate seus próprios Peritos Contadores Assistentes (ou assistentes técnicos). Esse é o teor do que dispõe o parágrafo 1º do mesmo Art. 465, a seguir transcrito:
§ 1º Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de nomeação do perito:
I - arguir o impedimento ou a suspeição do perito, se for o caso;
II - indicar assistente técnico;
III - apresentar quesitos.
Atente para o teor do comando acima, que dá às partes, no âmbito de um processo judicial, o direito de não só indicarem seus respectivos assistentes técnicos, como também de apresentarem eventuais motivos de impedimento ou suspeição do Perito do Juiz, além de apresentarem seus próprios quesitos para serem respondidos no Laudo Pericial.
O PERITO CONTADOR PODE CONTRATAR EQUIPE AUXILIAR?
Sim, mesmo na Perícia Judicial, o Perito Contador pode valer-se do trabalho de uma equipe técnica. Esse é o teor, por exemplo do item 13 da NBC TP Nº 1-r1/2020:
Quando a Perícia exigir o trabalho de terceiros (equipe de apoio, trabalho de especialistas ou profissionais de outras áreas de conhecimento), o planejamento deve prever a orientação e a supervisão do perito nomeado, que responde pelos trabalhos por eles executados.
Observe atentamente que – mesmo quando o Perito Judicial contrata uma Equipe Técnica, não poderá transferir a responsabilidade relativamente ao trabalho desses terceiros. Isso porque a norma vincula expressamente a responsabilidade pela orientação e supervisão ao Perito do Juiz.
QUAIS SÃO AS NORMAS A OBSERVAR NA ATUAÇÃO COMO PERITO CONTADOR?
Em linhas gerais, a legislação que regula – majoritariamente – a atuação do Perito Contador, tanto na esfera Judicial como fora dessa, são as seguintes:
- Novo Código de Processo Civil (Lei No. 13.105/2015)
- Código Civil (Lei No. 10.406/2002)
- Decreto-Lei No. 9.295/1946
- NBC TP Nº 1-r1/2020
-
Lei de Arbitragem (Lei No. 9.307/1996)
EXISTE CURSO ESPECÍFICO OBRIGATÓRIO PARA ATUAR COMO PERITO CONTADOR?
Existem muitos cursos livres de Qualificação Profissional e de Pós-Graduação que entregam muitas informações valiosas relacionadas à atuação do Perito Contador. Contudo, não há uma exigência legal que vincule a participação em quaisquer desses cursos à atuação do profissional Contador em atividades de Perícia Contábil. Portanto, a exigência legal para atuar como Perito é o que já consta na legislação acima indicada. Ou seja: “ser Contador devidamente inscrito e em situação regular junto ao CRC”.
Mesmo assim, vamos aproveitar para deixar aqui algumas sugestões de cursos de Qualificação Profissional. Esses programas – além de entregarem muito conteúdo valioso – oferecem suporte de tutores que são Contadores especializados nos temas estudados. Vamos a essas sugestões:
Curso Perícia Contábil Judicial e Extrajudicial
QUAL A RELAÇÃO ENTRE EXPERTISE PROFISSIONAL E ATUAÇÃO NA PERÍCIA?
Essa não é uma exigência que tenha previsão legal. Como dito acima, a única exigência legal para atuação na Perícia é a inscrição regular do Contador em seu Conselho Regional. Contudo, fica implícito que – para que essa atuação se dê de forma adequada – o profissional Contador deve ser um Expert na área demandada.
Vamos retomar o teor do Art. 465 do Novo CPC 2015 (Lei Nº 13.105/2015), que estabelece:
Art. 465. O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo.
Então, apesar de não haver vedação legal expressa, o profissional somente deverá aceitar nomeações ou contratações se o objeto da perícia for um campo em que tenha profunda experiência. Embora muitos artigos e orientações afirmem não ser necessária experiência para atuação, aconselhamos fortemente que você não se aventure em áreas nas quais não domine completamente. Há muitos riscos e desdobramentos no âmbito judicial e administrativo que podem impor multas e até penas aos peritos que agem de forma negligente ou até mesmo com imperícia.
HÁ RISCOS ENVOLVIDOS NA ATUAÇÃO DO PERITO?
Sim. Há sanções no âmbito Judicial e extrajudicial, que podem até causar desdobramentos junto ao Conselho de Classe. Por isso mesmo chamamos atenção para o disposto no Art. 158 do CPC 2015, que estabelece:
Art. 158. O perito que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas responderá pelos prejuízos que causar à parte e ficará inabilitado para atuar em outras perícias no prazo de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, independentemente das demais sanções previstas em lei, devendo o juiz comunicar o fato ao respectivo órgão de classe para adoção das medidas que entender cabíveis.
Mesmo que o perito não seja responsabilizado conforme disposto no artigo acima, é importante aduzir que – caso o resultado do Laudo Pericial não agrade ou até mesmo seja considerado por uma das partes como ofensivo/prejudicial – isso poderá acarretar eventuais processos contra o Perito. Portanto, esse é mais um alerta importante que deve ser levado em conta antes de você aceitar qualquer tipo de trabalho, especialmente uma nomeação.
QUAIS SÃO OS PASSOS PARA ATUAR COMO PERITO JUDICIAL?
Além dos requisitos e exigências de conformidade acima listadas, caso você tenha interesse em atuar como Perito Judicial, uma providência básica se faz necessária: Dirigir-se às Varas Judiciais nos Tribunais em sua cidade e cadastrar-se como Perito Judicial.
EXISTE UM CADASTRO NACIONAL DE PERITOS CONTADORES?
Em 2016 o Conselho Federal de Contabilidade – CFC instituiu o Cadastro Nacional de Peritos Contábeis -CNPC, por meio da Resolução CFC No. 1.502/2016. A inclusão no referido CNPC requer aprovação no Exame de Qualificação Técnica – EQT para Perito Contábil, sob responsabilidade do CFC.
Contudo, embora o referido cadastro exista, não é possível afirmarmos que os Magistrados se vinculam ao mesmo. Ou seja, na prática, há milhares de nomeações no âmbito do Judiciário, de Peritos Contadores que não estão devidamente cadastrados no CNPC. A recomendação básica – portanto – é a ação tendente ao cadastramento junto aos tribunais, já explicada no item acima.
ONDE ENCONTRO MODELOS DE LAUDOS E PARECERES DE PERÍCIA CONTÁBIL?
Cada trabalho de Perícia Contábil requer a produção de Laudo ou Parecer Contábil especificamente elaborado para as questões que são planteadas. Ou seja: não há uma ‘receita de bolo’ quando o assunto é ‘Modelo de Laudo ou Parecer’. Contudo, há sim como orientar seus futuros trabalhos a partir de exemplos, que podem servir de templates. Para tanto, sugerimos os que constam no curso:
Curso Perícia Contábil Judicial e Extrajudicial
Quer saber mais sobre o tema? Você pode participar enviando perguntas ou até mesmo artigos, bem como sugestão de novos temas para cursos, palestras, seminários ou workshops. Se você precisar realizar treinamentos fechados em sua empresa ou órgão público, entre em contato conosco. Será sempre um prazer atender.
Prof. Dr. Juracy Soares
É professor fundador da Unieducar. Fundador e Editor Chefe da Revista Científica Semana Acadêmica. Graduado em Direito e Contábeis. Especialista em Auditoria, Mestre em Controladoria e Doutor em Direito. Possui Certificação em Docência do Ensino Superior. É pesquisador em novas tecnologias para EaD/E-Learning. Escritor e autor do livro Enriqueça Dormindo. E-mail: juracy.soares@unieducar.org.br